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Gualdino Lopes, ao centro, de fato cinza e gravata preta |
Gualdino da Silva Lopes nasceu em Guimarães, em 1889. Após
ter concluído ali a instrução primária, veio para a vila da Póvoa de Lanhoso,
para empregado da casa comercial de Álvaro Ferreira Guimarães; casa que,
durante muitas décadas foi uma escola
para dezenas de empregados comerciais, que fizerem história no comércio
concelhio e não só. Naquele estabelecimento - que durante várias décadas foi o
mais importante da Póvoa de Lanhoso, sito na praça Municipal e dedicado à venda
de fazendas e acessórios para roupas, chapéus, guarda-chuvas, tabacos, chás e
café, livros e materiais de escritório e escolar, para além de ser, desde os
finais do século XIX, representante local de vários bancos e companhias
seguradoras - fez o jovem Gualdino a sua aprendizagem, passando todas as
etapas, de marçano a oficial. As capacidades de trabalho demonstradas pelo
jovem foram de tal ordem que Álvaro Ferreira Guimarães escolheu-o, quando ainda
contava pouco mais de dezoito anos, como seu substituto nas ausências e outros
impedimentos. A seriedade, a competência e a simpatia que irradiava de Gualdino
Lopes levaram Ferreira Guimarães, que não teve descendentes, a dar-lhe sociedade
no seu comércio, em Abril de 1921. À morte do fundador da casa, em 1944,
Gualdino da Silva Lopes tornou-se herdeiro não só da empresa comercial como de
vários outros bens do antigo presidente da câmara e administrador do concelho.
Para além de comerciante, Gualdino Lopes foi membro da
câmara e dirigente associativo. Em 1925, foi um dos três signatários do
requerimento que possibilitou a formação do grupo de futebol Maria da Fonte,
tendo vindo, nos finais da década de 1930, a tornar-se presidente da sua
direcção. Posteriormente foi presidente do conselho fiscal e da assembleia
geral de sócios.
Em 1931, foi um dos fundadores da chamada Liga dos
Interesses da Póvoa de Lanhoso. Em 1936, estando a corporação de Bombeiros
quase desactivada, integrou a comissão administrativa que procedeu à sua
reorganização e elaboração de novos estatutos.
Mais tarde, integrou a sua direcção. Da amizade com D. Anita Guimarães Lopes e
seu marido Manuel Dílio Silva, resultou a abordagem que possibilitou que aquele
casal, que era dono do Theatro Club, doasse esse edifício gratuitamente aos
Bombeiros que, a partir dessa altura, deixaram de estar em casa emprestado para
terem casa própria.
Foi destacada dirigente do Clube Povoense, cujos estatutos
ajudou a legalizar na década de 1940. Nas décadas de 1940 e de 1950, foi por
várias vezes vereador da câmara municipal e secretário da mesa da Misericórdia
e Hospital António Lopes ao longo de vários mandatos, cargos que desempenhou
sempre com grande elevação e seriedade.
Até que a vida começou a trocar-lhe as voltas. Utilizemos as
palavras de A. Sousa e Silva do semanário “Jornal da Póvoa” de 7 de Maio de
1985. “Figura de corpo pequeno, mas de
espírito e alma grandes”, “tinha como lema vale mais um bom nome que uma grande
riqueza. E não há duvida que até ao último minuto da sua vida foi fiel a esse
princípio. Todos sabem que foi senhor de uma apreciável fortuna, como sabem
todos que morreu quase na miséria”. No seu texto subordinado ao tema
Figuras da Póvoa, A. Sousa e Silva, que conheceu bem Gualdino Lopes, continua:
“Mas é inegável que o seu nome honesto
nunca foi manchado. Isto, porque preferiu perder todos os seus tostões, até ao
último, pagando os seus compromissos, que valer-se, como tantos o fazem (alguns
viajando engravatados em bons mercedes – de habilidades, infelizmente tão
possíveis e até fáceis no país em que vivemos. Mas pior que tudo, ou antes
revelador da incorrupta personalidade que possuía, Gualdino Lopes, terminou a
sua vida de forma que não merecia, porque foi vítima crucificada de muitas
gente sem escrúpulos, que aproveitando-se da sua boa fé e da incapacidade que
ele próprio reconhecia, de não quere agir judicialmente contra ninguém. No
entanto, em muitos casos, nem os motivos, nem as provas lhe faltavam. (…).
Tinha também um carácter de bondade impróprio de comerciante pois era incapaz
de negar um peça de vestuário a quem quer que dele se abeirasse a pedir fiado,
mesmo que soubesse, à partida, que nunca mais veria o dinheiro dessa venda. Possuía
um espírito jovial, sempre pronto a contar ou a participar numa alegre anedota.
Um dia, em vésperas de Natal, assistimos a uma que nunca esqueceremos e que
apesar de ser atrevida, não resistimos a contar. O Chinca levou lá uma
encomenda e como estávamos em época natalícia, o bom do Gualdino, depois de
mandar pagar o transporte, disse para o Chinca: Espera aí que te vou dar um
charuto para fumares na noite de Natal. Foi ao seu escritório, trouxe uma caixa
de charutos e deu-lhe dois. O Chinca veio para a rua todo satisfeito com a
oferta e contou ao irmão – que na altura andava com ele na distribuição. O
irmão do Chinca, foi logo pedir ao Gualdininho um charuto. Só que o Gualdininho
estava bem disposto e resolveu pregar uma partida ao homem:
-
Olha rapaz, aqui neste casa há horas para tudo. Quando o teu irmão cá veio,
estava na hora de dar charutos. Agora está na hora de apanhar no… se queres
aproveitar, entra ali para o escritório.
Claro
que ir irmão do Chinca reagiu forte e feio, o que fez o bom do Gualdino e quem
lá se encontrava rir a bom rir. Mas depois o homem, que saiu para a rua a
praguejar, lá levou o seu charuto (…). Mas honra seja feita a Gualdino Lopes,
pois, embora tendo morrido pobre, nunca traiu o lema da sua vida, já que
perdendo toda a sua fortuna, sempre soube conservar o seu bom nome”.
Gualdino da
Silva Lopes faleceu em 15 de Maio de 1975, solteiro, aos 86 anos de idade. O
semanário “Maria da Fonte” de 24 de mesmo mês e ano, escreveu: “Foi um homem
honesto e trabalhador e teve certo destaque no nosso meio, mas depois a sua
vida complicou-se e passou a viver humildemente”.
Morreu quase na miséria, depois de ter sido um homem rico. Apesar de tudo o que
foi, apesar de ter tido o seu nome ligado às grandes causas da Póvoa de Lanhoso
e do bem que fez a tantas pessoas e instituições, a sua memória caiu no
esquecimento. Merecia que quem dele se aproveitou o relembrasse. E merecia que
a Póvoa de Lanhoso desse o seu nome a uma das suas ruas. Era uma forma de os
mais novos o recordarem e de, como escreveu A. Sousa e Silva, recordarmos todos
a sua máxima: Mais vale um bom nome, que
muita riqueza. A riqueza, perdeu-a. Mas garantiu o bom nome.
José Abílio Coelho