quinta-feira, 23 de junho de 2011

Luís Joaquim Lopes Moreira (1933-2002) – Comandante dos Bombeiros

Luís Moreira nasceu na Vila da Póvoa de Lanhoso, no dia 18 de Agosto de 1933, filho de Manuel Oliveira Moreira e de Maria Rosa Lopes. Na terra natal completou o ensino primário oficial, já na nova escola António Lopes, alguns anos antes estreada. Entre os seus colegas de escolas, destacaram-se nomes como César Veloso, José Acácio Pereira Dias, José Rui Rebelo (Rui “21”), Lino Macedo, Jesuíno Ribeiro, Lino Rebelo ou Hermano Lopes.
Em 1958, os “Correios”, num processo de crescimento de serviços empurrado pelo boom da emigração para França, decidiu abrir vagas para carteiros no concelho. Em Porto d’Ave, o mais populoso lugar da freguesia de Taíde, o correio não era entregue a domicílio, mas através de uma casa comercial de que era proprietário César de Matos Cruz. O que, aliás, ocorria então na maioria das freguesias do concelho. Luís Joaquim Lopes Moreira foi um dos dois participantes no concurso de 1958, sendo integrado na empresa e colocado como distribuidor em Porto d’Ave.
Em 14 de Novembro de 1959, casaria com Maria Amélia Duarte Vieira, em Fontarcada. Do casamento nasceram sete filhos, seis dos quais ainda vivos.
Depois de ter feito “o giro” em Porto d’Ave durante alguns anos, e dado que a freguesia de Fontarcada solicitou, através da recolha de assinaturas dos seus habitantes, que ali fosse criado um novo giro de entrega postal, o que veio a acontecer, Luís Moreira pediu transferência para distribuidor nesta freguesia, argumentando que esta ficava mais perto da sua residência. Foi então colocado na estação da Póvoa de Lanhoso. Mais tarde, com a utilização de veículos motorizados para distribuição de correio, os “giros” tornaram-se mais rápidos e cada carteiro podia tomar a seu cargo áreas mais abrangentes. Luís Moreira passou a fazer a distribuição na freguesia de Galegos, vindo mais tarde, e durante muitos anos, a fazer o “giro” da Vila, o mais importante na carreira de qualquer distribuidor dos CTT. Deixou os “Correio” em 1993.
Mas Luís Moreira não foi apenas um excelente funcionário dos CTT, foi bombeiros dedicado, admitido na Corporação povoense em 1952, seguindo o exemplo de seu pai, Manuel Moreira, um dos mais dedicados soldados da Paz que os bombeiros da Póvoa conheceram. Luís Moreira, destacou-se pela sua competência técnica e sobriedade de modos, facto que levou o então comandante João Abreu a escolhê-lo para adjunto e, mais tarde, para segundo comandante. Com a saída de João Soares de Abreu (que passou ao quadro honorário), Luís Moreira ascendeu, naturalmente, ao comando da Corporação. Foi no dia 30 de Agosto de 1983. Mas os bombeiros viviam nesse tempo pós-revolucionário muita instabilidade. Descontente com a falta alguma indisciplina que reinava no corpo activo, Luís Joaquim Lopes Moreira viria a pedir a sua demissão em 1985. Apesar do curto período em que se manteve como comandante, Luís Moreira tornou-se, indubitavelmente, um dos grandes nomes da instituição.
Luís Joaquim Lopes Moreira faleceu na sua vila natal no dia 3 de Abril de 2002.

José Abílio Coelho

sexta-feira, 17 de junho de 2011

João de Almeida, “O Cego” (1845-1930) - Capitalista

João de Almeida, também conhecido por “João Cego”, devido ao estado de cegueira que, já adulto, o atingiu, foi um povoense de marcado carácter, odiado por muitos e por outros tantos amado.
Natural da freguesia de Fontarcada, onde nasceu aos 4 dias o mês de Agosto de 1845, era filho de António José da Silva e de dona Umbelina Tereza da Silva.
Depois de ter obtido uma rudimentar instrução básica, trabalhou, desde criança e até aos 28 anos, na agricultura. Aos 22 anos de idade dedicou-se a aprender música, tendo, depois, integrado numa banda filarmónica, com ela percorrendo toda a província. Foi por essa altura que começou a sentir uma imensa necessidade de partir, de conhecer mundo e, se possível, de garantir uma vida mais desafogada que aquela que a vida parecia querer dar-lhe. O Brasil era, nesses inícios do último quartel do século XIX, o destino desejado, o El Dorado que a todos fazia sonhar, e para João de Almeida o sonho não era distinto. E foi assim que, em 1874, contando 29 anos de idade, embarcou no vapor “Almeida Garret” com destino ao Rio de Janeiro, empregando-se na casa “Salgado Guimarães & Pereira” e, anos mais tarde, na “Magalhães Emílio & Comp.ª”, ambas com sede na Rua da Alfandega e dedicadas ao negócio de mobiliário e colchoaria.
Para além de lhe abrir lugar num emprego limpo, bem pago, o Brasil abriu a João de Almeida outras oportunidade, como a de aprender, de se cultivar, no fundo, de adquirir a “Luz” que o seu próprio país lhe negara. E ao longo de sete anos, trabalhou e estudou, matriculando-se, primeiro, como aluno do Liceu Literário Português, frequentando aulas nocturnas durante dois anos. A dedicação à aprendizagem valeu-lhe o reconhecimento e um diploma de mérito, bem como duas medalhas de prata. Tinha 32 anos de idade. Frequentou, depois, com igual aproveitamento, o Liceu de Artes e Ofícios, obtendo aprovação no exame final a que foi submetido. Maduro, conhecedor do meio, decidiu, então, estabelecer-se, alugando uma loja ainda na Rua da Alfandega, onde instalou o seu próprio negócio no mesmo ramo de negócio que praticara enquanto caixeiro.
Em 1891, cansado pela luta constante para singrar na vida, embora já senhor de significativos bens, empreendeu o primeiro regresso a Portugal. Mas, restabelecido de alguns problemas de saúde, voltou ao Rio de Janeiro, para se dedicar ao seu comércio. Tornou-se, nessa altura, benemérito da Real e Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência, do Real Club Ginástico Portuguez e do Liceu Literário Português. Fez ainda parte de várias irmandades da cidade, com destaque para a de Nossa Senhora da Candelária e de Nossa Senhora Mãe dos Homens, tendo, nesta, chegado aos órgãos dirigentes como tesoureiro.
Enveredou, então, pelos negócios imobiliários, ao adquirir no Rio de Janeiro vários prédios em ruínas, que depois reconstruir e vendeu, aumentando significativamente a sua fortuna pessoal.
Cansado do Brasil, com as saudade da sua terra a falarem mais alto no seu coração de povoense, vendeu os seus negócios em hasta pública e preparou o regresso a Portugal e à sua terra natal. Nesse entretanto a vida castigou-o duas vezes. Na primeira, levou-lhe a primeira esposa, mãe de sua, até então, única filha, Maria Antonieta. A segunda (no dia 1º de Abril de 1898), e vindo ele a descer o morro de Santa Teresa em direcção ao largo Carioca, sentiu-se subitamente envolto numa profunda nebulosidade: estava cego! Os médicos que consultou chegaram a prognosticar-lhe pouco tempo de vida, mas não quis assim a Natureza. Embarcou, enfim, rumo a Portugal.
Em Portugal, procurando cura para o seu mal, correu tudo quanto havia de praias, de termas, consultou os mais afamados médicos. Porém, sem resultados.
Construiu, então, casa na Póvoa de Lanhoso, onde viveu um novo futuro. E reconstruiu a sua vida, com o crescimento da família. A sua casa, construída no coração da Vila da Póvoa, ainda hoje se destaca de entre as demais. Tem marcada na frontaria a data 1910.
Sendo um homem que, até aos 30 anos, pouco mais sabia que escrever o seu nome, é notável o crescimento depois de, no Rio de Janeiro, se ter dedicado à aprendizagem. De modo que, em 1896, escreveu, e publicou, no Rio de Janeiro, uma espécie de história da Irmandade de Nossa Senhora Mãe dos Homens. Redigiu ainda um livro, que nunca foi publicado, com notas e impressões da sua vida.
Quando em 1895 veio a Portugal em férias pela primeira vez, promoveu na Póvoa de Lanhoso uma festa escolar e literária. Nela distribuiu medalhas de prata aos alunos distintos e proferiu uma palestra, na qual falou sobre o atraso da nação portuguesa comparada com todas as demais nações da Europa e com algumas da América, afirmando que, existindo no nosso país cinco milhões e meio de habitantes, apenas quinhentos mil sabiam ler, e muitos pessimamente e referindo-se à instrução da mulher, disse que, em Portugal, existia apenas uma escola para cada duas mil mulheres.
João Almeida foi, em suma, um homem que amou a instrução.
Diz-se que era muito senhor do seu nariz. Terá sido, aliás, um dos poucos povoenses que, em determinadas matérias, bateu o pé a António Lopes em alguns dos projectos (especialmente em matérias de negócios pessoais) que este pretendia fazer avançar. Em alguns deles, João de Almeida estava cheio de razão.
Faleceu na Póvoa de Lanhoso, aos 85 anos de idade no dia 16 de Novembro de 1930, deixando cinco filhos: Maria Antonieta (casada com o industrial lisboeta Albert Benvalet), Lusbelo, Antenor, Aníbal e João de Almeida.

José Abílio Coelho

José Augusto Távora (1891-1956) – Pintor

Ao longo das várias décadas em que residiu na Póvoa de Lanhoso, Távora, o pintor, encantou as gentes da terra com a sua pintura. Não apenas aqueles que tinham um gosto estético mais erudito, mas todos os que colocavam os olhos nos seus quadros, embora muitos dessas pequenas obras de arte não passassem de estudos ou de trabalhos não acabados, tal a necessidade que o artista tinha de fazer depressa, para ganhar o pão para a boca que tanta falta lhe fazia.
Nascido na freguesia dos Anjos, em Lisboa, no dia 20 de Novembro de 1891, José Augusto Távora frequentou a Escola Superior de Belas Artes[1]. Ali conviveu com alguns dos mais conhecidos pintores portugueses da primeira metade do século XX, como o famoso Abel Manta. Casou com dona Elvira da Silva Braga, brasileira de nascimento mas com ascendência na freguesia de São Gens de Calvos, concelho da Póvoa de Lanhoso. A memória oral guardou do casal a informação de que, sendo dona Elvira uma mulher com bens de fortuna, ambos dessa fortuna tiraram partido, tendo viajado inclusive para Paris, onde residiram alguns anos e onde Távora exercitou os seus dons pictóricos. Porém, em tempo de crise económica e de guerra na Europa, quando o dinheiro acabou decidiram fixar-se na vila da Póvoa, onde chegaram pelos finais dos anos Vinte da centúria de novecentos. Elvira, senhora de grande cultura, era procurada por famílias que lhe pediam que ensinasse aos filhos as primeiras letras. Távora, dedicou-se à pintura. Para a posteridade, deixou uma interessante pintura do pano de boca de cena do Theatro Club, onde, num arranjo clássico, deixou gravada parte da vila da Póvoa dos finais do primeiro quartel do século XX. Mas, talvez mais importante ainda na sua obra para a Póvoa de Lanhoso, deixou-nos uma imagem da heroína Maria da Fonte, que pintou numa parede interior do então Clube Povoense, que ganhou espaço próprio na cabeça dos povoenses, tendo sido vista, desde então, como a mais próxima daquilo que o povo queria que ela fosse. Nos anos quarenta, cinquenta, sessenta do século XX, a Maria da Fonte dos povoenses era a do Távora, pouco importante toda a qualquer outra representação iconográfica.
De Távora, ficou ainda, uma grande quantidade de pequenos quadros, todos riscados ao estilo clássico de quem “tinha escola”. Os mais belos recantos da nossa terra foram pintados pelo mestre, que registou ainda, tantas vezes em jeito de simples estudo, figuras populares da nossa mole humana. Parte significativa desses quadros resistem ainda nas paredes das casas daqueles que os compraram, muitas vezes por saberem que essa compra era a forma mais justa de ajudarem a diminuir as necessidades de um casal que, depois de tudo ter tido, acabou vivendo muito próximo da miséria.
José Augusto e Elvira da Silva Braga moraram num pequeno casinhoto do lugar da Portela, havendo ainda muito quem deles se recorde, pobres, mas distinguindo-se, sempre, pelo exotismo dos modos e do vestir, e pela forma simpática como com todos, ricos e menos ricos, se relacionavam.
Dona Elvira da Silva Braga, ou a Senhora Dona Elvira Távora, como lhe chamavam, faleceu no Hospital António Lopes da Póvoa de Lanhoso em Fevereiro de 1953, quando contava 80 anos de idade. José Augusto Távora não demorou muito a juntar-se à sua alma gémea, vindo a faleceu na mesma unidade de saúde em 16 de Agosto de 1956, vítima de um cancro que há muito o trazia doente. Tinha 64 anos de idade. Foi sepultado no cemitério municipal da Póvoa de Lanhoso, tendo ao seu funeral estado presente uma deputação dos bombeiros e uma representação do Grupo Cénico do Sport Club Maria da Fonte.
Na década de 1990, a câmara municipal atribuiu o seu nome à rua, no lugar da Portela, onde em vida habitou com a esposa. Uma homenagem justa a um homem-pintor que deixou um rasto de cometa na terra onde optou viver e que, por sua vez, o adoptou como um filho.
Ficou uma obra que fala por si, mais de meio século após a sua morte.

José Abílio Coelho


[1] SILVA, José Bento da, Em Cena. Theatro-Club (1904-2004), Póvoa de Lanhoso, CMPL, 2005, p. 197.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

D. Francisco Vieira e Brito (1850-1935) - Bispo, advogado e professor


Francisco José Ribeiro Vieira e Brito, nasceu em Rendufinho (Póvoa de Lanhoso), em 6 de Junho de 1850. Era filho do Doutor Francisco Hilário Ribeiro de Sousa e Brito e de sua mulher, dona Felizarda Rosa Vieira de Campos. Aos 12 anos de idade recebeu a “prima tonsura”, fazendo estudos no Liceu e no Seminário de Braga, onde concluiu Teologia. Depois, cursou a Universidade de Coimbra, terminando a sua formatura em Direito (em 1877), tendo recebido, entretanto, Ordens de Presbítero (7 de Junho de 1873). Já licenciado, abriu banca de advogado, foi professor do Seminário, regendo Teologia Moral, e, por influência sua, outras duas cadeiras foram criadas: introdução às ciências naturais e isagoge e princípios de hermnêutica sagrada. Mais tarde, foi promotor, vigário geral e reitor do liceu bracarense. Durante a ausência do arcebispo (1889) dirigiu a administração daquela Arquidiocese, vindo pouco depois a ser apresentado num canonicato da primacial Sé (1890). Apresentado para o Bispado de Angra em 13 de Janeiro de 1892, foi confirmado na mitra em 5 de Agosto e sagrado a 27 do mesmo mês e ano. Tomou posse, pessoalmente, da Diocese em 11 de Abril de 1892, data em que se fez a sua entrada solene.
Foi o 30º Bispo de Angra e governou a Diocese entre 1892 e 1901. Logo no início do seu episcopado teve de enfrentar sérios problemas resultantes da poderosa oposição que era movida ao bispo sempre que este pretendia permutar padres entre as diversas paróquias. Ficou célebre a disputa entre o bispo e as elites de Santa Cruz da Praia da Vitória sobre a transferência do “Padre Santo”, alcunha pela qual era conhecido o sacerdote Francisco da Rocha e Sousa, muito querido naquela localidade.
Promoveu um encontro geral do clero, tendo nele feito aprovar importantes orientações sobre vários temas pastorais, incluindo normas sobre o culto do Espírito Santo e sobre o relacionamento com as Irmandades do Divino Espírito Santo, então em fase de grande renascimento e de construção de Impérios.
Por Provisão de 17 de Janeiro de 1894 separou da ouvidoria de Vila Franca do Campo as freguesias que constituíram a ouvidoria do Nordeste, num território correspondente ao respectivo concelho.
Criou no Seminário Episcopal de Angra aulas de Liturgia e Cantochão (1899-1900) e pôs em execução um novo plano de estudos, onde, com a disciplina de Introdução às Ciências Naturais, se formou o chamado Museu do Seminário, que teve como orientador o cientista Dr. José Augusto Nogueira Sampaio, então Reitor do Liceu de Angra, que doou várias peças da sua valiosa colecção de História Natural.
Durante o seu episcopado nos Açores acentuou-se o clima de conflito entre o Estado português e a Igreja Católica, o qual se agudizou em Fevereiro de 1901 com o despoletar no Porto do escândalo conhecido pelo caso Calmon, o qual levou à aprovação pelas Cortes, sob grande pressão mediática, dos decretos de 10 de Março de 1901 e 18 de Abril de 1901, reforçando a proibição da existência de conventos e outras formas de comunidade religiosa, já banidos pelo liberalismo inicial, mas que entretanto tinham sido reticentemente tolerados. Em consequência daquele decreto, a existência de instituições religiosas foi novamente proibida, tolerando-se apenas aquelas que tinham como finalidade a instrução ou beneficência ou a propaganda da Fé e civilização no Ultramar. O reflexo imediato na diocese açoriana foi o encerramento forçado e a expulsão do arquipélago de dois sacerdotes jesuítas que há anos viviam isoladamente no antigo Convento da Graça, no Alto das Covas da cidade de Angra do Heroísmo (no lugar da actual Escola Infante D. Henrique).
Apesar da sua saída iminente, ainda acompanhou a visita real realizada pelos reis D. Carlos I de Portugal e D. Amélia de Orleães aos Açores, tendo estado na recepção real então realizada em Ponta Delgada, figurando em posição proeminente na pintura alusiva, da autoria de Ernesto Ferreira Condeixa, que existe no hall da entrada do Palácio de Santana, naquela cidade.
Numa decisão polémica, que provocou fortes reacções entre a população, os padres Francisco Pereira e Bernardino de Araújo, assim se chamavam aqueles clérigos, apesar de declararem não formar comunidade, foram considerados pelo governador civil como sendo estabelecimento de catequese, propaganda e doutrinação, logo incorrendo na extinção decretada. Não obstante as razões invocadas pelo bispo e as considerações, enérgicas e seguras, do Cabido expressas num documento notável, a forte agitação popular e da imprensa católica, foram os dois padres intimados a sair de casa e metidos em carro fechado e debaixo de custódia, sendo assim conduzidos até ao Castelo de São João Baptista do Monte Brasil, de onde embarcaram, à noite, pela baía do Fanal, para bordo do vapor Açor, que os levou para a metrópole.
A desautorização sofrida pelo bispo neste processo, e o consequente agudizar do conflito religioso entre as autoridades governativas, o bispo e a fortíssima maioria católica local, envenenou o resto do episcopado deste bispo, que obteve a apresentação para bispo da Diocese de Lamego logo em Dezembro daquele ano de 1901. O incidente foi um prenúncio dos grandes conflitos que se desencadeariam nos Açores com a implantação da república portuguesa e com a nacionalização dos bens da Igreja que se lhe seguiu.
Saiu da Diocese de Angra em princípios de 1902 para tomar posse da Diocese de Lamego, tendo recebido uma despedida
Em Lamego, onde a câmara da Póvoa de Lanhoso se fez representar na assunção do cargo epoiscopal pelo vereador padre Júlio Ferreira Sampaio, instituiu a Conferência de São Vicente de Paulo.
Estando D. Francisco José Ribeiro de Vieira e Brito em Lamego e, depois, em Rendufinho, ainda conferiu ordens presbiterais a novos sacerdotes dos Açores, que ali tinham de se deslocar devido à longa vacância da Sé de Angra que se seguiu à saída de um dos seus sucessores, o bispo D. José Correia Cardoso Monteiro (bispo de 1905 a 1910), que dados os problemas entre a novel República e a Santa Sé, apenas foi rendido em 1915.
Faleceu a 11 de Julho de 1935, aos 85 anos de idade, na sua freguesia natal de Rendufinho, onde residia desde o ano de 1922 em que renunciara a diocese de Lamego.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Adelino Campos de Carvalho (1867-1935) - Médico e Professor Catedrático

ADELINO CAMPOS DE CARVALHO


Adelino Vieira de Campos de Carvalho, nasceu em Gens de Calvos (Póvoa de Lanhoso), a 23 de Junho de 1867, e faleceu em Coimbra, em 23 de Outubro de 1935. Era filho de Adelino Vieira de Campos de Carvalho e de D. Narcisa Vieira de Freitas Lima. Doutorou-se na Universidade de Coimbra em 18-06-1897, sendo nomeado Professor Catedrático de Medicina em 28-06-1899. Homem bom e afável, era estimado e querido dos seus alunos, alguns dos quais lhe chamavam afectuosamente “pai Adelino”. Era também mestre e clínico de grande valor. Foi o iniciador da grande obra de profilaxia contra a tuberculose em Coimbra. Desde 1923 que a Faculdade de Medicina vinha trabalhando infatigavelmente para que essa cidade fosse dotada de todos os meios para combater essa terrível doença. De 1928 a 1931, em artigos publicados na Gazeta de Coimbra e em conferências públicas, tornou mais vigorosa a sua campanha. Em Maio de 1928, com a colaboração do Doutor Ângelo da Fonseca, que cedeu as instalações e material, conseguiu inaugurar o primeiro dispensário anti-tuberculoso em Coimbra, funcionando então nos Hospitais da Universidade. Ainda por sua iniciativa fundou-se a “Obra da Tuberculose de Coimbra”, e o curso de Tisiologia e de Medicina Social, que funcionou na Faculdade de Medicina, e que regeu gratuitamente. Devido ainda à sua acção, a Faculdade de Medicina criou o curso de enfermeiras visitadoras. Deixou as seguintes publicações: “Tuberculose e gestação”, (disssertação de licenciado, 1896); “As nucleínas e as propriedades bactericidas do soro”, (dissertação inaugural, 1897); “Profilaxia da peste, febre amarela e cólera-mórbus. Medidas aplicáveis à Europa”, (dissertação do concurso, 1891); “Rações e dietas dos Hospitais da Universidade”; “Valor da propaganda educativa”, (conferência realizada em Lisboa); “A Propaganda educativa da profilaxia da tuberculose”, (comunicação feita ao Congresso Nacional de Lisboa, em 1928); “Algumas sugestões relativas ao problema da tuberculose em Coimbra, um grande preventoso escolar nos Covões”, (conferência realizada em 1932, na Associação dos Médicos do Centro de Portugal). Fundou o jornal Bom Combate, órgão da Obra da Tuberculose em Coimbra e destinada às crianças das escolas. Foi Director do Laboratório de Análises Clínicas, Presidente do Conselho Médico-Legal, membro do Conselho Técnico dos Hospitais da Universidade e Director do Serviço Clínico de moléstias infecciosas e tuberculose pulmonar e membro da Comissão de Profilaxia da Tuberculose. Em 1900 foi encarregado duma missão de estudo na Suíça, permanecendo dois anos em Davos Platz, onde se especializou em doenças pulmonares. Por portaria de 11-06-1922 foi nomeado também em missão gratuita, pelo Ministro do Trabalho, para estudar a lepra.

Fonte. “Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Volume 35, Pág. 261”

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Lino António Vieira (1851-1913) – Médico, subdelegado de saúde na Póvoa de Lanhoso

Quando, a 29 de Outubro de 1913[1], escassos dias depois do falecimento de sua esposa D. Beatriz Pinto Teixeira de Carvalho Vieira, o Dr. Lino António Vieira deu o último suspiro, na sua casa do Largo Cândido dos Reis[2], o concelho da Póvoa de Lanhoso sentiu verdadeiramente a sua morte. Morrera o “médico dos pobres”; o “nosso doutor”, escreveu-se na imprensa local. Ficava a toda a população concelhi a saudade de um homem bom, sempre disponível para ajudar quem dele precisasse; mas, sobretudo, restou a lembrança de um médico que “valeu na doença” a quase toda a população do concelho, pois, durante cerca de duas décadas, foi o único facultativo municipal. Quando morreu, o seu retrato, propositadamente impresso para esse efeito, foi vendido na “Tipografia Povoense” como se de um santo se tratasse[3].
Natural de Águas Santas, em cuja Casa da Serzeda nasceu aos 20 do mês de Janeiro de 1851, filho legítimo de António Inácio Vieira de Carvalho e de sua mulher Teresa Joaquina de Araújo[4], formou-se em Medicina e Cirurgia na Escola do Porto. Instalado logo depois de terminado o curso na vila da Póvoa de Lanhoso, primeiro numa casa alugada na Rua dos Osórios, e, mais tarde, naquela que para si e sua família construiu no local onde existira a primitiva capela da Senhora do Amparo, teve sempre as portas abertas para os que dele precisavam. Para além de facultativo municipal, foi subdelegado de saúde, após a lei ter imposto esta figura clínica que dependia do delegado de saúde distrital. Nessa qualidade, tomou parte em muitas das iniciativas que marcaram a evolução da saúde no concelho, sendo mesmo um dos principais conselheiros de António Lopes quando este, em 1912, decidiu avançar com o projecto de fundação de um hospital na Póvoa de Lanhoso[5].
Um dos casos mais melindrosos da sua vida — e que serve para dar uma ideia de como, por ignorância ou interesse, certos indivíduos resistiram à evolução da ciência médica — deu-se quando, nos finais do século XIX, alertou para a falta de qualidade da água que abastecia um fontenário sito no largo onde habitava. Por a sua casa ter sido construída, havia pouco tempo, ali perto, logo surgiram acusações, dizendo que o Dr. Lino António Vieira queria aquela água para si, para a levar para a sua propriedade e que só por isso a dizia imprópria para consumo. Infelizmente, poucas semanas depois a desgraça deu-lhe razão, pois a demora da autoridade camarária em actuar, levou à morte de quase uma dezena de pessoas do concelho, tendo-se provado, posteriormente, que todas elas haviam bebido água daquela fonte.
Quando faleceu, contudo, o seu profissional era tão elevado que, nos anos que se seguiram à sua morte, chegaram a realizar-se romagens em sua honra ao cemitério municipal da Póvoa de Lanhoso, onde se encontra sepultado.

José Abílio Coelho 


[1] RCPL, livro de óbitos da freguesia de Lanhoso, 1913, fl. 96.
[2] Hoje Largo do Amparo. Este local já se disignava, nos meados do século XIX, por Campo do Amparo. Após o 5 de Outubro de 1910, a câmara municipal deu-lhe o nome de um dos obreiros da implantação da República em Portugal, muito embora, a não ser oficialmente, o povo tenha mantido a velha designação. Aos poucos, o nome do Almirante Cândido dos Reis foi sendo esquecido e no final da segunda década do século XX o topónimo “do Amparo” voltou a generalizar-se.
[3] Maria da Fonte de 9 de Novembro de 1913.
[4] ADB, Paroquiais da Póvoa de Lanhoso, Águas Santas, baptismos 1806-1861, fl. 52. Era neto paterno de José Joaquim Vieira e de Maria Rosa de Carvalho, naturais de Águas Santas, e materno de José Luis de Sousa e de Maria Joaquina de Araújo, da freguesia de Rendufinho.
[5] Inaugurado em 5 de Setembro de 1917.