Ao longo das várias décadas em que residiu na Póvoa de Lanhoso, Távora, o pintor, encantou as gentes da terra com a sua pintura. Não apenas aqueles que tinham um gosto estético mais erudito, mas todos os que colocavam os olhos nos seus quadros, embora muitos dessas pequenas obras de arte não passassem de estudos ou de trabalhos não acabados, tal a necessidade que o artista tinha de fazer depressa, para ganhar o pão para a boca que tanta falta lhe fazia.
Nascido na freguesia dos Anjos, em Lisboa, no dia 20 de Novembro de 1891, José Augusto Távora frequentou a Escola Superior de Belas Artes[1]. Ali conviveu com alguns dos mais conhecidos pintores portugueses da primeira metade do século XX, como o famoso Abel Manta. Casou com dona Elvira da Silva Braga, brasileira de nascimento mas com ascendência na freguesia de São Gens de Calvos, concelho da Póvoa de Lanhoso. A memória oral guardou do casal a informação de que, sendo dona Elvira uma mulher com bens de fortuna, ambos dessa fortuna tiraram partido, tendo viajado inclusive para Paris, onde residiram alguns anos e onde Távora exercitou os seus dons pictóricos. Porém, em tempo de crise económica e de guerra na Europa, quando o dinheiro acabou decidiram fixar-se na vila da Póvoa, onde chegaram pelos finais dos anos Vinte da centúria de novecentos. Elvira, senhora de grande cultura, era procurada por famílias que lhe pediam que ensinasse aos filhos as primeiras letras. Távora, dedicou-se à pintura. Para a posteridade, deixou uma interessante pintura do pano de boca de cena do Theatro Club, onde, num arranjo clássico, deixou gravada parte da vila da Póvoa dos finais do primeiro quartel do século XX. Mas, talvez mais importante ainda na sua obra para a Póvoa de Lanhoso, deixou-nos uma imagem da heroína Maria da Fonte, que pintou numa parede interior do então Clube Povoense, que ganhou espaço próprio na cabeça dos povoenses, tendo sido vista, desde então, como a mais próxima daquilo que o povo queria que ela fosse. Nos anos quarenta, cinquenta, sessenta do século XX, a Maria da Fonte dos povoenses era a do Távora, pouco importante toda a qualquer outra representação iconográfica.
De Távora, ficou ainda, uma grande quantidade de pequenos quadros, todos riscados ao estilo clássico de quem “tinha escola”. Os mais belos recantos da nossa terra foram pintados pelo mestre, que registou ainda, tantas vezes em jeito de simples estudo, figuras populares da nossa mole humana. Parte significativa desses quadros resistem ainda nas paredes das casas daqueles que os compraram, muitas vezes por saberem que essa compra era a forma mais justa de ajudarem a diminuir as necessidades de um casal que, depois de tudo ter tido, acabou vivendo muito próximo da miséria.
José Augusto e Elvira da Silva Braga moraram num pequeno casinhoto do lugar da Portela, havendo ainda muito quem deles se recorde, pobres, mas distinguindo-se, sempre, pelo exotismo dos modos e do vestir, e pela forma simpática como com todos, ricos e menos ricos, se relacionavam.
Dona Elvira da Silva Braga, ou a Senhora Dona Elvira Távora, como lhe chamavam, faleceu no Hospital António Lopes da Póvoa de Lanhoso em Fevereiro de 1953, quando contava 80 anos de idade. José Augusto Távora não demorou muito a juntar-se à sua alma gémea, vindo a faleceu na mesma unidade de saúde em 16 de Agosto de 1956, vítima de um cancro que há muito o trazia doente. Tinha 64 anos de idade. Foi sepultado no cemitério municipal da Póvoa de Lanhoso, tendo ao seu funeral estado presente uma deputação dos bombeiros e uma representação do Grupo Cénico do Sport Club Maria da Fonte.
Na década de 1990, a câmara municipal atribuiu o seu nome à rua, no lugar da Portela, onde em vida habitou com a esposa. Uma homenagem justa a um homem-pintor que deixou um rasto de cometa na terra onde optou viver e que, por sua vez, o adoptou como um filho.
Ficou uma obra que fala por si, mais de meio século após a sua morte.
José Abílio Coelho